De Ben-Hur a Game of Thrones, no que a computação gráfica impactou as produções Hollywoodianas
Hoje em dia, cinema é tanto uma manifestação artística quanto indústria, criando assim um mercado multibilionário focado principalmente no entretenimento. Ao longo de suas décadas, a balança estabelecida entre o cultural e o financeiro por vezes pendia mais para um lado do que para o outro.
Durante a chamada “Era de Ouro de Hollywood”, que é inaugurada na década 20 e dura até o final de 1940, os estúdios produziam filmes igual uma linha de produção fordista. Uma série de gêneros diferentes emergiram perante a necessidade de abarrotar salas de cinema pelo mundo, como foi o caso dos westerns, a comédia pastelão, filmes noir, musicais, desenhos animados, biografias e até mesmo o cinejornal. Por se enquadrarem facilmente em moldes de produção, sua replicabilidade obedecia quase exclusivamente às necessidades de distribuição e exibição.
As empresas cinematográficas ganhavam dinheiro ao operarem sob o chamado “Sistema de Estúdio”, em que as companhias mantinham milhares de pessoas em salário permanente, como atores, produtores, realizadores, escritores, dublês, artesãos e técnicos. Além disso, eram proprietários de centenas de salas de exibição pelo mundo – teatros estes que mostravam seus filmes e que estavam sempre em alta demanda por material fresco. Contudo, aos poucos, este sistema foi perdendo forças graças ao surgimento de uma nova tecnologia revolucionária que mudaria para sempre os hábitos de consumo. Sem ver motivos para sair de casa, o audiovisual passou paulatinamente a ocupar a sala de estar graças à televisão.
"A nova Hollywood" e "cinema pós-clássico" são termos utilizados para descrever o período após o declínio do “Sistema de Estúdio” nos anos 50. Afinal de contas, porque sair do conforto do meu sofá para ver filmes em um cinema tendo que, ainda por cima, pagar por isso? Pela necessidade, a indústria cinematográfica se adaptou e repensou seu modelo de produção. Desde então, os filmes norte-americanos criaram um novo formato: os blockbusters. Com a finalidade de legitimar o cinema como o local ideal para se ter toda a experiência audiovisual, tirando assim as pessoas de casa, os estúdios passaram a depender de um punhado de lançamentos extremamente caros para se manterem rentáveis.
Tais blockbusters enfatizavam o espetáculo, a força de atores e atrizes extremamente conhecidos e o elevado valor de produção. Estes filmes de orçamentos astronômicos dependiam do sucesso prévio de suas estrelas e da publicidade maciça para atrair uma enorme audiência. Ao invés de produzir centenas de obras no ano, agora, os estúdios se programavam para lançar uma dezena de filmes capazes de gerar filas de dobrar o quarteirão. Aclamados pela crítica e bem-sucedidos nas bilheterias, é neste período que nomes como Coppola, Spielberg e George Lucas surgem e foram responsáveis por moldar o modelo comercial vigente até os dias atuais. “O Poderoso Chefão”, “Tubarão” e “Star Wars” moldaram toda uma geração e estabeleceram aos estúdios a necessidade em cada vez mais produzirem êxitos que fatalmente façam parte da cultura popular mundial.
Foi o caso do filme “Ben-Hur” do diretor William Wyler, de 1959, que teve o maior orçamento e os maiores cenários construídos na história do cinema até então. Para as cenas de ambientação e batalhas, mais de duzentos camelos, 2,5 mil cavalos e dez mil figurantes foram contratados e minuciosamente coordenados nos sets criados para o filme. A produção durou um ano, inclusive com a batalha marítima sendo realizada com efeitos práticos em um grande tanque de água nos estúdios da MGM. Sem contar com a praticidade, barateamento e acesso que a computação gráfica dos dias de hoje proporciona, tudo tinha que ser feito do zero e pronto para a câmera. Por este motivo, os gastos com produção foram os primeiros até então a superar a casa dos 15 milhões de dólares – algo gigantesco para a época.
Dando um salto temporal para os dias de hoje, outro audiovisual de gastos consideráveis quanto a sua feitura diz respeito a “Game of Thrones”. Ao longo de oito temporadas e mais de sessenta episódios, a obra inspirada nos livros de Martin foi – assim como “Ben-Hur” em seu tempo – a série mais cara até então, cujas filmagens envolveram até quatro unidades paralelas e a produção de efeitos visuais exigiu a participação simultânea de quatorze estúdios em diferentes países. Pode parecer muito, mas a realidade do audiovisual atual mostra cada vez mais uma mudança nos esforços, se concentrando muito mais para a pós-produção do que nas filmagens em si.
As capacidades das imagens geradas por computador (CGI) ultrapassaram tudo o que as gerações anteriores de artistas poderiam ter imaginado. Cenas e personagens inteiros podem agora serem criados digitalmente. O polimento digital pode tirar anos ao rosto de um ator, baixar o seu peso em alguns quilos ou fazê-lo um exímio cavaleiro ao brandir sua espada. Inclusive, os efeitos visuais reduzem custos. Tomando por exemplo as obras aqui citadas, começamos com “Ben-Hur”. Na clássica cena da competição em bigas, todo o cenário foi construído pelo estúdio. Contudo, para dar a dimensão magnânima pretendida, a parte superior do estádio foi feita com maquetes móveis que emulavam o público. Ou seja, a ilusão se dá por um truque de ótica, mas que precisou ser feito de maneira prática em set – o que custou 1/15 de todo o orçamento. Já em “Game of Thrones”, toda e qualquer batalha de proporções épicas tem como amigo o CGI. Apenas uma parte é real, feita com atores e itens de cena. O resto é replicado em computação e, a partir deste ponto, o céu é o limite.
A flexibilidade do digital "resolve questões de marketing, questões históricas, questões de atores, questões financeiras. Tornou-se a panaceia da indústria cinematográfica", disse Scott Ross, co-fundador do estúdio de efeitos Digital Domain, que produziu efeitos visuais para Titanic e Apollo 13. Contudo, ele destaca a importância em “criar situações harmoniosas entre o prático com o virtual para assim, dentro de uma proposta única de linguagem e de arte, tudo culmina em uma experiência única para o espectador em que ele se deixa levar pela narrativa sem distinções”. De igual forma, pensamos aqui na Fauno Filmes.
O acesso às tecnologias gráficas proporcionou grandes mudanças nas produtoras ao redor do mundo, já que efeitos antes impraticáveis, agora, fazem parte de produções dos mais variados portes. Mesclar situações reais de set com o digital foi algo pensado no nosso último filme intitulado “2021: Uma Nova Odisseia no Espaço”, em que 90% do material finalizado conta com computação gráfica. Contudo, adequações e cuidados no roteiro, direção e filmagem precisam ser feitos para que, no final, tudo saia harmonioso e posto a serviço da história. Aliar o prático com o virtual se faz necessário cada vez mais para ampliar as possibilidades de comunicação. Os efeitos visuais funcionam como soluções criativas para fazer as mais impressionantes narrativas que o público se apaixonará. Eles não são o fim, mas o meio.
Confira nosso filme de ficção espacial – “2021: Uma Nova Odisseia no Espaço” - em https://vimeo.com/639640675